sábado, 20 de dezembro de 2014

Algumas considerações sobre... regularidade fiscal, patrocínios e futebol.




           Tenho visto e lido muitas coisas a respeito do lado financeiro dos clubes de futebol faladas e discutidas em programas de televisão. Muitas enquetes, opiniões de comentaristas e demonstrações de desconhecimento do assunto são vistas e ouvidas diariamente nos programas esportivos. Também o assunto patrocínio por parte de empresas estatais também grassa na mídia esportiva. Discorrerei sobre ambos os assuntos no presente texto, tentando mostrar de maneira simples e didática a minha opinião, que se baseia no fato de ter sido (e ainda ser até abril 2015) Conselheiro Fiscal no Cruzeiro e empregado da Caixa Econômica Federal, que é a estatal que mais apoia o futebol com patrocínio nas camisas.

Medida provisória aprovada pela Câmara e pelo Senado:

                Na semana compreendida entre 14 de dezembro e 20 de dezembro deste ano foi votada na Câmara Federal e no Senado da República uma medida provisória que discorre sobre a situação fiscal dos clubes brasileiros. Tal medida foi aprovada e, a partir daí, foi encaminha à sanção da presidência da República, isto é, aguarda a aprovação do Poder Executivo. Várias partes interessadas, e que participaram das negociações, se sentiram traídas, pois a medida provisória não incluiu em seu texto alguns tópicos que interessavam aos jogadores, aos clubes e também ao governo, o Fair Play financeiro. Da maneira como a medida foi votada, ficou a sensação de que o que aconteceu foi a aprovação de um novo REFIS específico, que tem como foco simplesmente a negociação da dívida fiscal dos clubes. É bom lembrar que, recentemente, foi aprovado outro REFIS, o chamado REFIS da Copa, ao qual muitos clubes aderiram, cansados de esperar a Lei de Responsabilidade Fiscal dos Clubes ser votada.
                Ao que me consta, a parte que mais interessava aos movimentos envolvidos na questão, ficou por conta do regulamento das competições, o que repassa à CBF, a tarefa de fiscalizar, acompanhar e punir os clubes que não cumprirem o regulamento. Entendo que assim realmente não agradou a todos, pois sabemos que o lado político, econômico e geográfico sempre influenciou a CBF em suas decisões. Melhor seria que uma lei federal fizesse a regulamentação de tal assunto e estipulasse punições e responsabilidades aos que estivessem com a tarefa de fazer cumpri-la.
                Quanto aos descontos dados nos juros e correções das dívidas são comuns em renegociações de débitos, em bancos, financeiras, cartões de crédito e mesmo em dívidas fiscais em prefeituras, estados e na União. Não se dá desconto em dívida (o valor inicial devido). Dá-se um desconto na taxa de juros e outros emolumentos. Adequa-se o percentual de juros à realidade do momento econômico que o país vive. Como as dívidas são antigas, alguns índices poderiam ser exorbitantes e não corresponder à estabilidade econômica que vivemos.
Não foi favor específico e inventado para nenhum clube de futebol. Se houve algum favor foi o fato de se ampliar o prazo de pagamento para 240 meses (20 anos), pois no REFIS da Copa o prazo foi menor. Assim sendo, os valores das prestações diminuem, pois o prazo aumenta.
Como a medida provisória foi votada agora, os débitos fiscais até a data da aprovação são passíveis de serem incluídos no parcelamento. Levarão vantagem os clubes que estavam com dívidas recentes, como Cruzeiro, São Paulo e até mesmo o Flamengo, que vem cumprindo à risca os acordos anteriores. Assim sendo, tais clubes poderão receber suas certidões negativas de tributos com maior agilidade que os outros que levarão um tempo maior para conciliar seus débitos, a não ser que concordem com os valores cobrados pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e os reconheçam.

Patrocínio de empresas estatais:

                Antes de tudo devo me manifestar a favor dos patrocínios de empresas estatais, não só no esporte, como em qualquer atividade que possa lhes oferecer visibilidade. Muitas empresas estatais estão disputando mercado com empresas privadas e o sucesso de suas atividades decorre também da exposição de suas marcas. Entendo que uma empresa pública que não oferece seus produtos esta incorrendo em favorecimento da marca concorrente.
                Assim sendo, sou um defensor ferrenho dos bancos públicos exporem suas marcas em diversos clubes esportivos. Coube à Caixa Econômica Federal a primazia de estampar sua marca nas camisas dos times de futebol.
                Muito tenho visto na imprensa as afirmações de que a Caixa está comprometida com o patrocínio de diversos times que se encontram sem o patrocinador máster. Já li que a Caixa patrocinará o Cruzeiro, o Atlético Mineiro, o América Mineiro, o Santos, o Palmeiras, o Fluminense e vários outros expoentes do futebol. Gostaria que assim fosse. Mas não é assim que funciona.
                Primeiramente temos que lembrar que, a Caixa, por ser uma Empresa Pública está sujeita à legislação competente que rege os patrocínios públicos. Um dos primeiros preceitos é que não se pode patrocinar uma entidade que esteja em dívida com o governo federal. Para colocar a marca da Caixa em sua camisa, é necessário estar com a situação fiscal em dia e também, para receber as parcelas mensais do contrato, mensalmente deve-se comprovar que os tributos estão em dia. De que adianta aderir ao REFIS, fechar um patrocínio com a Caixa e não manter os pagamentos de tributos em dia? A Caixa depositará os valores bloqueados em conta corrente e não os liberará. Isso acontece atualmente com o Vasco da Gama, patrocinado pela Caixa: fechou um patrocínio de muitos milhões de reais por ano e não pode colocar a mão no dinheiro, pois está bloqueado. O próprio Cruzeiro tem um recurso bloqueado em conta (do patrocínio do atletismo) por não apresentar as certidões. Outro fator dificultador é que os recursos somente serão liberados caso haja uma prestação de contas mensal do gasto do dinheiro. Muitos clubes não conseguem prestar contas, pois nem sempre possuem notas de despesas. Difícil de acreditar, mas acontece.
                Vários clubes veem em tais exigências um dificultador, pois o patrocínio privado não prevê prestação de contas e somente cláusulas de desempenho.  Gasta-se como bem lhes convém, o que, com certeza, é mais propício para gastos ilícitos e também para desvios.
                É bom ressaltar que a Caixa, como empresa pública, deve se pautar pelo regime da transparência de seus atos e, para tanto, deve definir uma previsão de gastos com patrocínios e ter seu orçamento aprovado pelo Conselho Diretor. Estamos em uma época do ano e principalmente em uma época política, na qual não se sabe ainda os destinos das empresas estatais no ano que virá. Dúvidas como os nomes dos dirigentes (haverá mudanças na direção da empresa?), o foco a ser dado pela área de marketing (continuará ensejando o futebol?), o fato de ser necessário o  contingenciamento dos gastos públicos e a orientação do novo Ministro da Fazenda podem fazer com que a Caixa deixe de patrocinar até os atuais clubes por ela patrocinados.
                Assim sendo, as eventuais reuniões de clubes com a Caixa, não são definitivas. São apenas visitas nas quais se mostram as intenções de cada parte, e nas quais se demonstram os potenciais mercadológicos que cada marca de clube possui. É impossível, no dia de hoje, assegurar que patrocínios estão bem encaminhados ou fechados.

                Qualquer informação dada, além disto, é mera especulação.    






Nenhum comentário:

Postar um comentário