Salomé é uma antiga conhecida. Não sei como ela apareceu no Cruzeiro. Reza a tradição que, quando a sede administrativa ainda funcionava no Parque Esportivo Barro Preto, havia uma galeria com todos os troféus que o Cruzeiro havia ganhado até então. Um dia apareceu uma jovem pedindo emprego no Cruzeiro como auxiliar de serviços gerais. Quando lhe mostraram as dependências da sede administrativa e ela viu a sala de troféus, ficou extasiada e, de tão Cruzeirense que era, disse que trabalharia de graça se a deixassem polir e limpar os troféus daquela sala. Eram troféus levantados por capitães Cruzeirenses e representavam tantas glórias e esforços, que então seria uma honra para ela cuidar daquelas preciosidades. Desde então, o troféus Cruzeirenses são os mais brilhantes de Minas Gerais, não só pelo valor das conquistas, muitas inéditas em nosso estado, como também pelo carinho que a eles Salomé dispensa. Feliz ela, que ganha seu salário fazendo aquilo que gosta!
Outra prova da diversidade e qualidade de nossa torcida é, exatamente, a autora da crônica sobre Salomé: a Colunista Laura Medioli.
Sempre fui leitor assíduo das colunas de Laura e gosto muito de ler os livros por ela escritos. Acho que temos estilos parecidos, pois gostamos de retratar as preciosidades do dia a dia de maneira bem acessível a quem nos lê. Entretanto, em suas colunas Laura sempre mostra e conta a sua preferência clubística tão oposta à minha. Suas colunas nos levam a um tempo, não muito distante, onde havia mais romantismo no simples fato de ir ao Mineirão assistir a um jogo do time do coração. Ela nos conta casos de vitórias atleticanas, como também de frustrações, como no dia em que Roberto César, artilheiro do Cruzeiro, marcou vários gols e ela enfurecida, atirou longe o radinho no qual ouvia o jogo e disse que aquele rádio nunca mais transmitiria gols de Roberto César! Para mim, Laura Medioli, sempre foi um "Kalil de saias" tão grande é, ou era, a sua paixão pelo time do outro lado da lagoa.
Com o advento do SADA Cruzeiro Laura sempre está presente nos jogos do time de volei, afinal, seu marido, Vitorio, e seu cunhado, Alberto, são os dirigentes do grupo empresarial que gere caminhões transportando veículos, edita jornais, tem fundições, produz autopeças e até patrocina uma equipe de voleibol. E Laura torce com muita alegria e entusiasmo, como se, ao invés de camisas azuis, lá estivessem as alvi-negras, que um dia foram vestidas por Badalhoca, Fernandão ou Pelé. Tal comportamento tão sincero, vindo de uma xiita atleticana, nos remete a pensar o quão fútil é a violência que impera entre torcidas. A convivência com os jogadores e a amizade com torcedores de outros times nos fazem ver que, embaixo das camisetas estão amigos, parentes e principalmente, gente como a gente mesmo.
Bem, o discurso é um e a realidade é outra. Devo me penitenciar porque, quando estou assistindo o jogo ao lado dela, sempre a provoco dizendo que ela fica muito bem cantando: "Vamos, vamos, Cruzeiro"! E ela canta mesmo, com muito orgulho e muito amor, pela equipe de volei que tem muito do seu trabalho e dedicação.
Laura Medioli
No dia em que se atrasa, fico preocupada: cadê a mulher da raposa? Basta dizer isso que todos sabem a quem me refiro
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Ânimos esquentados
Da cadeira do ginásio do Riacho, em Contagem, de onde assisto aos jogos do Sada Cruzeiro, procuro, na arquibancada, aquela figura extravagante, com seus longos cabelos mesclados de branco e louro e sua raposa de pelúcia. Costuma sentar-se sempre no mesmo lugar - empolgada e empolgante -, já conhecida pelos torcedores celestes.
No dia em que se atrasa, fico preocupada: cadê a mulher da raposa? Basta dizer isso que todos sabem a quem me refiro. E ela sempre aparece com sua camisa azul, seus cabelos compridos, a face marcada pelo tempo e pela vida. De onde vem? Não fazia ideia. Mas gostava da presença constante daquela senhora diferente, divertida e apaixonada.
Até que, nesta semana, indo ver os treinos do meu time de vôlei, na sede do clube, no Barro Preto, vejo ao longe os mesmos cabelos tingidos, as unhas pintadas de azul... Será???
Pergunto-me, curiosa, até perdê-la de vista. Subo ao centro de treinamento e a primeira pergunta que faço é:
- A mulher da raposa trabalha aqui? Descubro que sim e também que seu nome é Salomé, antiga faxineira do clube.
Adoro figuras assim. Torcedores folclóricos que fazem a diferença. Virei fã da Salomé, senhora humilde que, após um dia exaustivo de trabalho, costuma ir a Contagem, a um ginásio, provavelmente distante de onde mora. Ela e sua raposa, somente para ver o Sada Cruzeiro jogar.
Nesse dia em que a descobri, discutíamos a questão dos ingressos. Nosso adversário dificultara a disponibilidade dos mesmos. Isso porque nosso time também não ofereceu a eles os 20% devidos, pois o prazo de requisição havia vencido. Em clima de decisão, os ânimos se alteram e, por mais que queiramos que tudo dê certo, não tem como. Procuro não me meter na confusão. Diferente do que era antes, hoje sou da turma do "paz e amor".
- Por que não demos os 20%? Pergunto.
- Porque, quando pediram, já era fora do prazo e não tínhamos mais ingressos. Desisto de discutir o que não tem mais retorno. Os ingressos são poucos para a enorme demanda, mas peço, de antemão, para reservarem o da Salomé.
Daqui para frente, sei que será assim: ânimos acirrados, discussões movidas não somente pela razão, mas, também, pela emoção. Faz parte do jogo, principalmente nas decisões ganhas nos detalhes.
No domingo, dia 8, assisti, na TV, ao jogo de outra semifinal, entre RJX e Vôlei Futuro. Venceu quem teve mais raça. Numa melhor de três, será decidido o nosso adversário para a final da Superliga, no próximo dia 21.
Existem times que, com dinheiro, contratam os melhores e mais caros jogadores do país e ainda compram 12 mil camisas para uniformizar uma torcida inteira. Entretanto, a "alma" de um time não se compra.
Seja como for, é gratificante ver os ginásios lotados, popularizando cada vez mais o que já é considerado o segundo esporte do Brasil, até há pouco tido como um esporte das "elites".
Que venham os torcedores uniformizados, assim como as torcidas organizadas, trazendo paixão e alegria aos ginásios. Somente assim darão a esse belíssimo e empolgante esporte o verdadeiro valor que merece.
Emoção. Nesta semana, outra grande emoção: o primeiro transplante multivisceral (estômago, duodeno, intestino, pâncreas e fígado) realizado na América do Sul, pela equipe comandada pelo doutor Ben-Hur. A ele, ao doutor Sérgio e a toda a equipe, o meu mais profundo respeito e admiração.
No dia em que se atrasa, fico preocupada: cadê a mulher da raposa? Basta dizer isso que todos sabem a quem me refiro. E ela sempre aparece com sua camisa azul, seus cabelos compridos, a face marcada pelo tempo e pela vida. De onde vem? Não fazia ideia. Mas gostava da presença constante daquela senhora diferente, divertida e apaixonada.
Até que, nesta semana, indo ver os treinos do meu time de vôlei, na sede do clube, no Barro Preto, vejo ao longe os mesmos cabelos tingidos, as unhas pintadas de azul... Será???
Pergunto-me, curiosa, até perdê-la de vista. Subo ao centro de treinamento e a primeira pergunta que faço é:
- A mulher da raposa trabalha aqui? Descubro que sim e também que seu nome é Salomé, antiga faxineira do clube.
Adoro figuras assim. Torcedores folclóricos que fazem a diferença. Virei fã da Salomé, senhora humilde que, após um dia exaustivo de trabalho, costuma ir a Contagem, a um ginásio, provavelmente distante de onde mora. Ela e sua raposa, somente para ver o Sada Cruzeiro jogar.
Nesse dia em que a descobri, discutíamos a questão dos ingressos. Nosso adversário dificultara a disponibilidade dos mesmos. Isso porque nosso time também não ofereceu a eles os 20% devidos, pois o prazo de requisição havia vencido. Em clima de decisão, os ânimos se alteram e, por mais que queiramos que tudo dê certo, não tem como. Procuro não me meter na confusão. Diferente do que era antes, hoje sou da turma do "paz e amor".
- Por que não demos os 20%? Pergunto.
- Porque, quando pediram, já era fora do prazo e não tínhamos mais ingressos. Desisto de discutir o que não tem mais retorno. Os ingressos são poucos para a enorme demanda, mas peço, de antemão, para reservarem o da Salomé.
Daqui para frente, sei que será assim: ânimos acirrados, discussões movidas não somente pela razão, mas, também, pela emoção. Faz parte do jogo, principalmente nas decisões ganhas nos detalhes.
No domingo, dia 8, assisti, na TV, ao jogo de outra semifinal, entre RJX e Vôlei Futuro. Venceu quem teve mais raça. Numa melhor de três, será decidido o nosso adversário para a final da Superliga, no próximo dia 21.
Existem times que, com dinheiro, contratam os melhores e mais caros jogadores do país e ainda compram 12 mil camisas para uniformizar uma torcida inteira. Entretanto, a "alma" de um time não se compra.
Seja como for, é gratificante ver os ginásios lotados, popularizando cada vez mais o que já é considerado o segundo esporte do Brasil, até há pouco tido como um esporte das "elites".
Que venham os torcedores uniformizados, assim como as torcidas organizadas, trazendo paixão e alegria aos ginásios. Somente assim darão a esse belíssimo e empolgante esporte o verdadeiro valor que merece.
Emoção. Nesta semana, outra grande emoção: o primeiro transplante multivisceral (estômago, duodeno, intestino, pâncreas e fígado) realizado na América do Sul, pela equipe comandada pelo doutor Ben-Hur. A ele, ao doutor Sérgio e a toda a equipe, o meu mais profundo respeito e admiração.
LAURA MEDIOLI escreve no Magazine às terças-feiras. laura@otempo.com.br
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